Condenação criminal da jornalista que cobriu caso Mariana Ferrer é ultrajante

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A juíza Andrea Cristina Rodrigues Studer, titular da 5ª Vara Criminal de Florianópolis, condenou a jornalista Schirlei Alves a um ano de prisão e ao pagamento de R$ 400 mil em indenização pelo crime de difamação, em decorrência da publicação de reportagem sobre o caso da influenciadora digital Mariana Ferrer. Mariana foi humilhada durante o depoimento que prestou, na qualidade de vítima, no julgamento do acusado de estuprá-la em 2018.

Em reportagem publicada em 2020 pelo The Intercept Brasil, Schirlei Alves revelou o constrangimento e a violência praticados contra Mariana no curso do processo. O episódio causou indignação nacional e motivou a criação da Lei 14.245, que prevê punição para atos contra a dignidade de vítimas de violência sexual e das testemunhas do processo durante julgamentos.

Os processos criminais que agora levaram à condenação de Schirlei Alves foram movidos pelo juiz Rudson Marcos e pelo promotor Thiago Carriço de Oliveira envolvidos no julgamento do estupro de Mariana Ferrer. A situação de humilhação a qual foi submetida a influencer, revelada pela jornalista, é tão flagrante que, na última terça-feira (14/11), o Conselho Nacional de Justiça puniu o magistrado por sua omissão na condução da audiência.

É incompreensível, portanto, que Schirlei seja condenada à prisão e a pagar uma vultosa indenização, incompatível com sua renda e patrimônio – num montante que nem mesmo grandes veículos de comunicação suportariam – ao funcionário público cuja conduta foi considerada incompatível com os deveres que permeiam a atividade jurisdicional. Mais do que isso, é inadmissível e ultrajante que uma jornalista, no exercício da sua profissão, relatando um grave assunto de interesse público, seja duramente punida e condenada criminalmente por supostamente ofender a honra de funcionários públicos.

Vale destacar a violência de gênero permeia toda a história que une Mariana Ferrer e Schirlei Alves. Uma mulher é humilhada perante à Justiça num momento em que tanto o juiz como o promotor tinham o dever de protegê-la. A jornalista que revela esse gravíssimo episódio também sofre, na sequência, uma violência do Poder Judiciário, que se soma a outras enfrentadas diariamente por mulheres jornalistas – alvos preferenciais no conjunto de ataques contra a imprensa no Brasil.

O jornalismo é elemento essencial para garantir o escrutínio de agentes públicos. Os fatos revelados pela reportagem de Schirlei Alves não caracterizam ataques à honra do promotor e do juiz envolvidos, mas sim o direito da imprensa de informar e o dever do agente público de prestar contas. Foi a partir da reportagem de Schirlei Alves que o caso foi amplamente debatido na sociedade, culminando, como mencionado, na aprovação da Lei Mariana Ferrer.

Schirlei Alves é uma profissional conhecida nacionalmente pela relevância e seriedade de seu trabalho como repórter. Manifestamos assim nossa profunda solidariedade a ela, reafirmando a confiança em seu trabalho. E esperamos que o Poder Judiciário reconheça, nas instâncias recursais, a importância do jornalismo, das mulheres jornalistas e da liberdade de imprensa, com a integral reversão dessas absurdas decisões.
Tratam-se, neste momento, de dois dos seis processos judiciais enfrentados por Schirlei Alves, em virtude da mesma matéria jornalística. Serão muitas as oportunidades para que o Judiciário brasileiro defina se protege as liberdades de expressão e de imprensa, ou se nos leva pelo caminho sombrio que conduz jornalistas à autocensura e ao encarceramento.

17 de novembro de 2023.

Assinam este documento:

Assinam este documento:

ARTIGO 19 Brasil e América do Sul
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
Associação de Jornalismo Digital (Ajor)
Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ)
Instituto Tornavoz
Instituto Vladimir Herzog
Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores
Repórteres Sem Fronteiras (RSF)
Associação Fiquem Sabendo