Anúncio de Datena na EBC copia os piores modelos do setor comercial e expõe falta de projeto para as emissoras públicas
A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e os Sindicatos dos Jornalistas do Distrito Federal, Município do Rio de Janeiro e São Paulo repudiam o anúncio da contratação de José Luiz Datena como novo apresentador das emissoras públicas federais da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).
As entidades foram surpreendidas por notícia publicada pela Folha de S.Paulo, nesta terça-feira (2), informando que o polêmico apresentador passaria a integrar a grade da TV Brasil e da Rádio Nacional.
Ao longo de sua trajetória em veículos privados, Datena consolidou um tipo de “jornalismo” marcado pelo desrespeito sistemático aos direitos humanos e pelo proselitismo político – práticas vedadas pela legislação que rege a comunicação pública e que criou a EBC. Mesmo atuando no setor privado, o comunicador foi expressão máxima de uma prática de infrações legais de normas em vigor para o setor de radiodifusão e a legislação em geral, relacionadas, por exemplo, a exposição indevida de pessoas e famílias, desrespeito à presunção de inocência, incitações à desobediência a leis ou decisões judiciais, incitação ao crime e à violência, identificações de adolescentes em conflito com a lei, promoção de discursos de ódio ou preconceito, incluindo de caráter racista, torturas psicológicas, tratamentos desumanos e degradantes. Tudo isso foi fartamente documentado em um relatório do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), publicado em 2016, sobre uma ampla análise dos programas policialescos, dos quais Datena é um dos maiores ícones.
A contratação de Datena explicita, mais uma vez, a ausência de um projeto consistente para a comunicação pública federal. A EBC chega ao quarto presidente em três anos. O atual gestor, André Basbaum, ex-diretor de empresas privadas, não apresentou, até o momento, contribuição concreta ao fortalecimento ao setor, no que se refere aos princípios e objetivos definidos na lei federal que instituiu a EBC, tais como promoção da cultura nacional, estímulo à produção regional e à produção independente; respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família; não discriminação religiosa, político partidária, filosófica, étnica, de gênero ou de orientação sexual; observância de preceitos éticos no exercício das atividades de radiodifusão; e autonomia em relação ao Governo Federal para definir produção, programação e distribuição de conteúdo no sistema público de radiodifusão.
Denunciamos o desmonte imposto à EBC desde 2016, após o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, quando o governo Michel Temer liquidou a autonomia dos veículos públicos. No governo Bolsonaro, enfrentamos tentativas de privatização e censura.
Chega a ser irônico, para não dizer um escárnio, que o governo Lula agora promova a contratação de um aliado de do ex-presidente Jair Bolsonaro, que esteve ao seu lado no momento em que, derrotado nas urnas e encastelado no Palácio da Alvorada, já no fim de 2022, o agora condenado pela trama golpista se recusava a reconhecer o legítimo resultado das urnas, abrindo caminho para episódios que quase desgraçaram a democracia brasileira.
No início do terceiro governo Lula, lutamos pela retomada da participação social – ainda frágil -, pela valorização profissional e pela reestruturação da empresa. Contudo, após três anos, pouco avançamos. Os trabalhadores seguem sem um plano de carreiras aprovado pelo governo federal. O quadro de pessoal é hoje 30% menor que em 2016, e a direção resiste à realização de concurso público.
Em sentido oposto, a gestão investe valores milionários em terceirizações, como no programa Sem Censura, e agora na contratação de Datena, mesmo diante de uma alegada situação de asfixia orçamentária para investimentos e custeio.
As entidades sindicais reafirmam sua defesa intransigente do papel da comunicação pública na sociedade brasileira, comprometida com o interesse público, a diversidade e os direitos humanos – e não com imitações mal feitas do modelo comercial, sobretudo daqueles que reafirmam a cultura da violência, que não cabem em uma proposta que deveria inovar e propor à sociedade a oferta de conteúdos educativos, culturais, científicos e de alta qualidade jornalística, tal como claramente define o princípio constitucional expresso no artigo 223 da Carta Magna.
Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ)
Sindicatos dos Jornalistas DF, SP e Rio





