O sonho do CFJ não acabou

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aloisio1Persistentes, os jornalistas brasileiros e suas entidades de representação sindical prosseguem na luta pela conquista de seu órgão de proteção e fiscalização do exercício profissional: o Conselho Federal dos Jornalistas, cuja criação foi deliberada em Congresso Nacional da categoria. Mesmo a manobra que ceifou o debate do projeto na Câmara dos Deputados e a reação patronal não intimidaram ou arrefeceram os ânimos dos dirigentes da Federação Nacional e Sindicatos de Jornalistas. É o que nos aponta o 1º Secretário da FENAJ e presidente do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais, Aloísio Lopes. Assessor do Crea-MG e entrevistador do programa Cidade na TV Comunitária de Belo Horizonte, Aloísio tem participado de importantes discussões como acesso e qualidade do ensino superior e sobre a ética profissional. É autor da Proposição Legislativa, em discussão pelos deputados estaduais mineiros, que cria o Conselho Estadual de Comunicação Social. Com esta bagagem, ele assegura que a luta pelo CFJ continua.

E-FENAJ – A votação do projeto do CFJ em regime de urgência, interrompendo a tramitação normal e a possibilidade do debate democrático sobre a matéria, evidenciou o acordo entre o governo e a oposição, rifando os interesses dos jornalistas e premiando a forte reação contrária dos empresários de comunicação ao projeto. Há expectativa de que num futuro próximo o CFJ tenha outra acolhida no Congresso Nacional? 

Aloísio – Trabalhamos numa perspectiva de médio prazo, para possibilitar que seja feito um amplo debate com a categoria e com a sociedade, sobre a necessidade de manter a regulamentação de nossa profissão e de criar um órgão que fiscalize essa legislação regulamentadora. Esse, inclusive é um dos eixos da Campanha de Valorização Profissional dos Jornalistas que lançaremos em breve. O tema vai ficar na pauta da categoria pelo menos até meados de 2006, quando estaremos realizando o XXXII Congresso Nacional dos Jornalistas. 

E-FENAJ – As alterações que a própria FENAJ propôs ao projeto original, após consulta à categoria e sindicatos, teve pouca audiência no parlamento, como também pouca repercussão pública. Quais são as mudanças significativas em relação à primeira proposta? 

Aloísio – A principal delas foi em relação à natureza jurídica do órgão, que seguindo sugestões da OAB, passou a ser definido como serviço público não governamental. O nome também foi alterado, ao invés de Conselho de_Jornalismo, passou a ser dos Jornalistas, para deixar bem claro que nossa prioridade é a profissão e não a atividade. Além disso, deixamos clara a regra de composição das instâncias diretivas, com o processo de eleição direta por todos os jornalistas brasileiros, sem diretoria provisória na fase inicial. 

E-FENAJ – Se a proposta de criação do Conselho Federal dos Jornalistas zela pelos interesses públicos, pela liberdade de imprensa, pela melhoria da qualidade de informação, pela ética e valorização profissional dos jornalistas, por quê os proprietários de veículos de comunicação e alguns articulistas e profissionais em altos postos nas empresas reagiram tão negativamente? Eles também não se beneficiariam com o CFJ? 

Aloísio – A categoria profissional e a sociedade se beneficiarão com a criação deste órgão. Os jornalistas ganham um órgão de proteção de seu trabalho, garantindo-lhes autonomia para exercer sua profissão. Ganham também um órgão com poder legal para normatizar questões como estágio e as distintas atribuições profissionais. A sociedade ganha em qualidade da informação, pois teremos um órgão para zelar pela ética, pela liberdade de imprensa e pela boa formação do jornalista. Divergências dentro da própria categoria sobre a necessidade do Conselho são naturais e saudáveis. Antes da criação da OAB, e até hoje, têm advogados contra a existência daquele órgão. 

E-FENAJ – Recentemente o deputado Celso Russomano apresentou na Câmara – e depois retirou para possibilitar maior debate – um projeto propondo a criação da Ordem dos Jornalistas do Brasil (OJB). No que ele se aproxima ou distancia da proposta do Conselho Federal dos Jornalistas? 

Aloísio – No conteúdo é basicamente a mesma coisa, já que ambos são órgãos de normatização e fiscalização profissional. A Ordem (como é o caso da OAB) é composta de um conselho federal e dos regionais. Nossa proposta, inclusive contempla vários artigos presentes no projeto do deputado Russomano. A diferença existente dentro dos sistemas de fiscalização profissional brasileiros, é que os Conselhos têm que prestar contas ao Tribunal de Contas da União. Já a OAB é uma autarquia especial, que não tem essa obrigatoriedade de dar satisfações ao Estado. É o modelo que nós queremos, independente da sigla que receberá. Falamos isso desde o momento que o projeto foi apresentado à Câmara, em agosto de 2004, mas a mídia não nos deu ouvidos. 

E-FENAJ – Após a rejeição do projeto do CFJ na Câmara dos Deputados, como a FENAJ pretende prosseguir nesta luta? 

Aloísio – Os Sindicatos já estão retomando a discussão. Com o início da Campanha de Valorização Profissional este assunto voltará a ser amplamente debatido dentro e fora da categoria. Também já sugerimos a vários parlamentares a realização de audiências públicas para aprofundar o debate. 

E-FENAJ – A FENAJ e os jornalistas tiveram um papel destacado na vida do país com o combate à ditadura, enfrentando a legislação sindical autoritária e sendo a primeira entidade nacional a realizar eleição direta para sua direção, na campanha das Diretas Já, no movimento que levou ao Impeachement do Collo_… No entanto, nos últimos tempos nossa profissão e as bandeiras que levantamos, como a exigência do diploma para o exercício do jornalismo, a democratização da comunicação, a liberdade de imprensa e o CFJ são duramente atacadas. Estamos vivendo um novo momento de retrocesso? 

Aloísio – A correlação de forças mudou. Passamos por um período de estagnação sindical na década de 90 que só agora está sendo superado. Enquanto isso, os empresários da comunicação se fortaleceram econômica e politicamente. Veja a bandeira da liberdade de imprensa. Quem garante este direito à população são os jornalistas, que operam a liberdade de imprensa no seu trabalho diário e não os empresários do setor, que ao contrário, cerceiam a liberdade de imprensa toda vez que seus interesses estão em jogo. Por isso, a bandeira da liberdade de imprensa deve estar sempre acompanhada pela bandeira da democracia na comunicação. A questão da formação sempre foi combatida por aqueles que querem desregulamentar tudo. Essa posição é contrária à tendência mundial. Veja o caso da Europa e Estados Unidos: lá está ocorrendo um forte movimento de qualificação acadêmica dos jornalistas, inclusive onde não se exige o diploma. O que os empresários brasileiros querem? Deixar tudo em aberto, para que possam fazer o que for melhor para seus interesses. A necessidade e o direito do cidadão por informação de qualidade fica em segundo plano.

E-FENAJ – Obrigado pela atenção, Aloísio. O próximo convidado do Entrevistas é o ex-presidente da FENAJ, Audálio Dantas, que recentemente assumiu a Vice-Presidência da Associação Brasileira de Imprensa – ABI. Audálio, que está concluindo um livro lembrando os 30 anos da morte do jornalista Vladimir Herzog, vai falar sobre como a categoria enfrentou a ditadura, o papel da ABI neste momento, a história da FENAJ e a luta em defesa da profissão. Os interessados devem encaminhar perguntas para o e-mail boletim@fenaj.org.br até as 18 horas do dia 10 de julho.