Participantes do 19º Congresso da Abraji debatem informalidade no mercado de trabalho

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As mudanças do mercado de trabalho jornalístico, em função da crise do modelo de negócios e do consequente crescimento de trabalhadores atuando sem carteira de trabalho assinada, dominaram a discussão na mesa “Entre a CLT e a vida freelancer, quem apoia e assegura o profissional em carreira solo?”, no 19° Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, realizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), em São Paulo. O debate reuniu as jornalistas Adriana Amâncio, Kátia Brasil, Samira de Castro e Sanara Santos, com mediação de Joana Suarez.

Adriana Amâncio, jornalista recifense, trabalha há dois anos como freelancer. Nesse período, ainda não desfrutou de férias e precisou de muito planejamento para vender suas matérias no hard news local e pagar suas contas. Afinal, um atraso no prazo de entrega da sua produção resultaria no atraso do recebimento do pagamento.

Kátia Brasil, uma das fundadoras da agência de jornalismo independente Amazônia Real, conhece bem essa realidade. A jornalista trabalhou como freelancer por 10 anos e vivenciou os percalços desta modalidade de trabalho que não tem a segurança dos direitos trabalhistas como licenças e auxílios, “Eu tive apenas 2 meses de licença maternidade”, conta.

Hoje, à frente de uma organização sem fins lucrativos, a  Kátia revelou que enfrenta desafios para arcar com as despesas tributárias de um jornalista devidamente contratado (CLT). “Uma repórter nossa recebia cerca de R$ 5 mil bruto e quis ser demitida para ser contratada novamente como PJ para receber R$ 5 mil de forma líquida”, relata.

A diretora da Associação Laboratório de Jornalismo Énóis, Sanara Santos, contou como a sua instituição age para garantir, na medida do possível, condições de trabalho dignas para os jornalistas. A receita da Énóis, advém da Lei Rouanet, além de um financiamento externo que possibilita o custeio de bolsas de projetos de jornalismo para cerca de 1,7 mil profissionais espalhados pelo Brasil e o pagamento de todos os trabalhadores da associação em regime de MEI e microempresa.

“Nós temos na Énóis 13º salário, férias para toda a equipe e o auxílio institucional [para os trabalhadores PJ]”. O auxílio institucional é um apoio anual captado pela instituição e distribuído para seus trabalhadores no encerramento do ano, com critérios raciais e econômicos. Sanara contou que além disso, os salários pagos pela associação estão acima do piso salarial correspondente ao terceiro setor e às organizações de jornalismo. Ademais, a cultura corporativa da associação delimita o salário dos cargos mais altos, como o da direção, com um teto de quatro vezes mais que o menor salário da entidade

A presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), Samira de Castro, diferenciou o freelancer (que sempre existiu, sobretudo na área do fotojornalismo), do PJ (pessoa jurídica) e MEI (microempreendedor individual). Segundo ela, é preciso compreender essa diferença e o que caracteriza o vínculo formal de trabalho para que os profissionais não sejam vítimas de precarização ou do falso discurso do empreendedorismo.

“Uma situação é você ser um freelancer, que atua esporadicamente para um veículo, em coberturas específicas, contratado para tal fim; a outra é você abrir um MEI, que nem tem essa modalidade para Jornalista, para receber por um trabalho que somente você faz, de maneira habitual, subordinada e remunerada (pessoalidade, não eventualidade, subordinação e onerosidade)”, disse.

Segundo a dirigente sindical, o emprego de jornalistas com carteira assinada vem caindo no Brasil, mas ainda é uma realidade. Em 2013, haviam 60.899 trabalhadores do jornalismo contratados como CLT no país. Esse número caiu para 48.443 em 2022, uma redução de 20,5% ou 12.456 vagas a menos. Mas isso não significa que a carteira assinada acabou o que só existe esse modelo de contratação.

“Temos visto surgir, há alguns anos, o que a professora Roseli Fígaro descreve como novos arranjos produtivos no campo do jornalismo, que são iniciativas unindo três ou quatro colegas que resolvem apostar no jornalismo que acreditam: mais diverso, plural e em defesa dos direitos humanos ou das pautas invisibilizadas pela mídia empresarial”, pontuou.

Para Samira de Castro, é fundamental que as organizações, ao captarem recursos para seus projetos jornalísticos, revejam os custos de contratação de jornalistas, prevendo os encargos sociais da CLT. “Sabemos que as entidades sem fins lucrativos terão dificuldades de convencer seus financiadores, mas a transparência é fundamental, tanto de quem contrata quanto de quem é contratado”.

Com informações da Abraji

Fotos: Emilly Cassiano