Relatório da Federação Internacional dos Jornalistas aponta que 38% das jornalistas latino-americanas relataram já ter sofrido ataques online relacionados ao gênero e ao trabalho
A discriminação e a violência racial sofridas por jornalistas negras latino-americanas no mundo offline se intensificaram ainda mais no ambiente digital. As redes sociais tornaram-se um novo campo de batalha onde as profissionais são alvos constantes de violência. Alarmantes 38% das jornalistas da região admitem ter sofrido ataques online explícitos, motivados por gênero, raça ou pela atuação profissional, segundo o relatório Latam Journalism Review 2024 da International Federation of Journalists (IFJ).
Para combater essa realidade, a Rede de Proteção Digital para Comunicadoras Negras (REPCONE) – iniciativa pioneira na América Latina que une cibersegurança, acolhimento e proteção jurídica para jornalistas e comunicadoras negras, indígenas e quilombolas – acaba de lançar a cartilha “Proteção Digital para Comunicadoras Negras na América Latina”, em Português e Espanhol, que reúne estratégias, boas práticas e ferramentas para fortalecer a segurança digital, a integridade informacional e o enfrentamento da violência de gênero online.
O lançamento foi anunciado durante o evento “Resistir é Comunicar”, realizado no dia 24 de novembro na Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), e reuniu jornalistas, ativistas, lideranças comunitárias, pesquisadoras e defensoras de direitos, incluindo representantes de organizações internacionais como a latinoamericana AfroColectiva, a Women’s March (representada pela americana Tamika Middleton) e o Comitê Global da Marcha das Mulheres Negras (representado pela argentina Sandra Chagas).
“As jornalistas negras precisam de uma rede de segurança para conseguir trabalhar em um ambiente seguro, e as redes sociais não oferecem isso. As vozes dessas jornalistas precisam ser ouvidas dentro e fora das redações, e o objetivo da REPCONE com essa cartilha é fornecer as ferramentas necessárias para essas jornalistas reconhecerem os abusos, saberem como lidar com eles e ter os materiais didáticos adequados para denunciar essas violências”, explico Marcelle Chagas, coordenadora de REPCONE e membro da Rede JP.
O evento de lançamento da cartilha, no contexto da Marcha das Mulheres Negras 2025, foi organizado pela Universidade de Brasília, Gecoms/UNB, o projeto Cartas para o Amanhã, REPCONE, a Red de Periodistas Afrolatinos, Rede de Jornalistas Pretos pela Diversidade na Comunicação (Rede JP) e a Mozilla Foundation. O encontro também analisou a relação entre a mídia tradicional e as comunidades periféricas, destacando a ausência e distorção de narrativas que levam à marginalização dessas populações ao focar em estereótipos de violência em vez de aspectos culturais, de resistência e empreendedorismo.
Em contraponto, a conferência ressaltou o papel vital do jornalismo negro na descentralização e humanização das histórias, trazendo a perspectiva das populações negras e produzindo conteúdo que celebra a negritude e questiona estruturas racistas e coloniais. Nesse sentido, foi debatido o enfrentamento ao racismo estrutural dentro das redações e na cobertura, apresentado o jornalismo negro como uma ferramenta essencial para superar a injustiça informacional.
Palestrantes como a jornalista Jacira Silva (Cojira Brasília da Federação Nacional dos Jornalistas), Juliana Cézar Nunes (gerente de Jornalismo Digital na EBC), e Natália Purificação (coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ), destacaram a vulnerabilidade e a resistência de jornalistas negras, que enfrentam a violência política, racial e de gênero ao exercerem a profissão – inclusive dentro das próprias redações, mas se mantém fortes e continuam trabalhando e reforçando a importância da luta contra a violência de gênero e raça.
Sobre a Rede JP
Fundada em 2018, a Rede de Jornalistas Pretos Pela Diversidade na Comunicação (Rede JP) é uma organização não-governamental dedicada a democratizar a comunicação e promover a participação de jornalistas negros nesse processo. A iniciativa se estrutura em três pilares principais: educação, representatividade e oportunidade, com o objetivo de promover a inovação e conexões estratégicas. A Rede JP atua como um elo entre aproximadamente 200 veículos de comunicação afrocentrados, grandes mídias, empreendedores, estudantes e comunicadores de diversas regiões do Brasil.





