A CVM e o exercício do Jornalismo

715

* João Carlos Leal

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) pode estar prestando inestimável serviço à campanha de regulamentação da atividade jornalística e aos que defendem a necessidade de criar o Conselho Federal de Jornalismo. Na edição de O Globo, de 18 de agosto, a presidente da Comissão, Maria Helena Santana, diz que a polêmica Instrução 388 não pretende censurar os jornais. Seria apenas, segundo ela, “uma regulação da atividade do analista de investimento e que RESVALA na discussão do jornalista, na medida em que ele recomende ativos”.

Resvala… É teoria dos conjuntos. Ao demarcar o que considera pertencer ao campo dos analistas de mercado, a CVM cria uma área de interseção com o campo da atividade de difusão de informações que pertenceria ao conjunto dos jornalistas – no caso, da área financeira. E cria então uma dúvida. Quem vai mandar mais nessa terra de dois donos: o lado que defende o “deixar fazer” ou, o outro, que crê que apenas regras claras e funções regulamentadas protegem direitos.

Se não entender, e rápido, que os ideais da Revolução Francesa não combinam nada com uma sociedade de cartórios, feudos, ordens e conselhos diversos como a brasileira, o jornalismo irá assistir o conjunto da atividade de difusão de informações (aí entendidas não apenas as notícias, mas também – ameaça a Instrução 388 – os textos opinativos) ser devorado, de fora para dentro, pela multiplicidade de áreas de interseção com os campos que dezenas de novas atividades vorazmente regulam e delimitam como seus.

O caso da CVM pode ser visto como um divisor de águas. Até então, perdemos sem chiar a liberdade de cuidar dos arquivos dos jornais para os arquivistas; da biblioteca do jornal para os biblioteconomistas; do bandejão dos jornais para os nutricionistas, da fazer um puxadinho para novas máquinas do jornal para os engenheiros e arquitetos; de nos defendermos para os advogados etc. Todos direitos que ficam no entorno da atividade fim que sempre nos interessou: o jornalismo. Agora, quem sabe é a vez de lotear as redações e tornar a informação propriedade das áreas que as produzem e não material de trabalho do jornalista, que as flagra, analisa e reporta à sociedade?

* Editor do Correio da Serra