Bloqueio do X não altera padrão de ataques a jornalistas nas redes durante as eleições

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O segundo relatório de monitoramento de ataques on-line contra a Imprensa nas Eleições de 2024, que cobre a terceira semana de campanha eleitoral (29 de agosto a 4 de setembro), mostra uma alteração importante no volume de publicações ofensivas coletadas no período, devido à determinação pelo STF de suspensão do X em todo território nacional, concretizada no último dia 31. Nos dois dias de monitoramento antes do bloqueio, foram mapeados 3.702 posts ofensivos / ataques a jornalistas e meios de comunicação no X. Já no Instagram, foram 1.314 nos sete dias monitorados.

Porém, embora o volume de publicações ofensivas tenha caído em comparação ao primeiro relatório, o padrão dos ataques a jornalistas e meios de comunicação se mantém, com uso de hashtags ofensivas e termos chulos visando a desqualificação tanto do profissional de imprensa como do veículo no qual ele/a trabalha.

Fonte: Labic/UFES
Fonte: Labic/UFES

O tema que dominou as redes sociais brasileiras neste período foi justamente o bloqueio do X, com críticas fortes ao posicionamento de jornalistas que cobriram a medida do STF. Os mais visados, na própria plataforma, foram Andréia Sadi (67 ataques), André Trigueiro (30), Karina Michelin (16) e Camila Bomfim (13). No Instagram, os jornalistas mais atacados na semana foram Vera Magalhães e Leonardo Sakamoto, ambos sendo alvo de 35 postagens ofensivas cada. Abaixo, alguns exemplos dos posts:

“A militante hipócrita @AndreiaSadi disse que o X virou uma rede social tóxica. A pergunta é porque vocês ainda mantém a contém de vocês nessa rede social ainda já que é Tóxica? Única coisa Toxica no X é esse jornalismo lixo que vocês fazem e mentem. Eu desafio você…”

“@karinamichelin Jornalista militante não tem vergonha de mentir mas tem vergonha de ver as críticas e desprezo do Brasil.”

“@reinaldoazevedo Você é uma vergonha. Jornalista com rabo preso com político e juíz não é respeitado”

“@leonardosakamoto sa-fa-do jornalista de aluguel”

“Essa Daniela Lima é sem dúvidas a maior pros7i7uta do jornalismo brasileiro”

Fonte: Labic/UFES
Fonte: Labic/UFES

Os ataques aos meios de comunicação no X também mantiveram o padrão intenso de hostilidade direcionado principalmente aos veículos do Grupo Globo, a partir do uso de hashtags como #globolixo (678 menções), #globosta (40) e #desligaaglobo (9). Outras hashtags que se destacaram foram #jornalixo (27), #cnnlixo (12), #vejalixo (6), #imprensalixo (6) e #midialixo(6).

Entre os veículos que sofreram ataques estão GloboNews (324), O Globo (31), CNN (25), G1 (22), Veja (16), O Estado de S.Paulo (12), Jovem Pan (11) e UOL (11). No Instagram, os principais alvos do período foram: GloboNews (128), O Estado de S.Paulo (127), Folha de S.Paulo (74) e O Globo (56). Abaixo alguns exemplos de postagens:

“@GloboNews @juliaduailibi Sério globolixo.. vcs ultrapassam todos os limites de serem fdp.. não sei como conseguem chegar em casa e olhar para seus filhos.. vocês são muito lixo…”

“@CNNBrasil A imprensa vermelha vulgo: relações públicas do Luladrão e do Xandão. Correndo desesperadamente para tirar o foco da merda que o Alexandre de Moraes fez. Pra quem entende essa situação é mais que corriqueira.”

“@JovemPanNews #jovempanlixo abaixou as calças pro sistema. So bunda mole se esquerda nessa emissora 😔”

“O mais impressionante é que até o ser humano mais analfabeto tem interpretação de texto melhor que os jornalistas da @folhadespaulo…”

Fonte: Labic/UFES
Fonte: Labic/UFES

Violência na TV, no rádio e nas redes

No período deste relatório, teve início a propaganda eleitoral obrigatória no rádio e TV e a continuação das sabatinas e entrevistas feitas por veículos de comunicação. Uma das entrevistas que mais gerou repercussão foi a do candidato à prefeitura de São Paulo Pablo Marçal (PRTB) no programa Roda Viva, da TV Cultura, no dia 2/09. A entrevista desencadeou uma série de ataques nas redes contra jornalistas que compunham a bancada do programa, em especial contra a repórter da Agência Pública Amanda Audi, a colunista do jornal O Globo Malu Gaspar e o diretor de redação do Alma Preta, Pedro Borges. Borges foi vítima de ofensas racistas perpetradas por seguidores do candidato, recebidas inclusive por mensagens diretas no Instagram.

A repórter Amanda Auditambém foi alvo de ofensas do deputado estadual Denian Couto (Podemos/PR), apoiador do candidato Pablo Marçal. Ele usou seu canal no YouTube e o programa que tem em uma emissora de rádio para atacar a jornalista, referindo-se a ela como “semianalfabeta” por sua participação no Roda Viva.

Os principais agressores no X

Antes do bloqueio do X, foi possível mapear os perfis que mais utilizaram tags ou termos ofensivos à imprensa associadas a menções diretas a veículos de comunicação e jornalistas. Segundo o Labic-Ufes, responsável pelo monitoramento, essa prática faz parte de uma estratégia para impulsionar tags, utilizada para aumentar a sua visibilidade, tornando os ataques mais disseminados e amplificando seu alcance dentro da rede.

Ao associar as tags a figuras da mídia, esses usuários buscam fortalecer a narrativa de deslegitimação da imprensa e dos profissionais envolvidos. Os 10 usuários que mais publicaram ataques no período foram: @jacksontoledo6, @amaralina0866, @francisvalim, @marizmarcella, @scheilafratho, @sidneybeff, @gareth_rocha, @busch_novo, @nunomusik e @ patriam777.

Além dos ataques à imprensa, as hashtags mais mobilizadas por esses usuários incluem #STFOrganizacaoCriminosa, #ForaLulaJá, #ForaLulaLadrão, #ForaLulaLadrao e #ForaLulaeSuaQuadrilha. As postagens revelam uma convergência de críticas direcionadas tanto à imprensa quanto a figuras políticas de destaque no país. Cinco dos dez principais agressores incluem na apresentação de seus perfis bandeiras do Brasil e menções ao ex-presidente Jair Bolsonaro e à “ditadura do STF”.

Ataque fora das redes

O período foi marcado também por ataques a jornalistas fora das redes.  No dia 29 de agosto, em Manaus/Amazonas, foi registrado um episódio de agressão física contra o repórter Adriano Santos, do Radar Amazônia. Santos estava tentando questionar o prefeito da cidade, David Almeida (Avante), sobre possível crime eleitoral cometido no local, quando foi atingido por um golpe do seu segurança, identificado como tenente Renato Araújo Mota, que tentou arrancar o microfone da mão do jornalista.

Sobre o projeto

Em parceria com o Labic/UFES, a Coalizão em Defesa do Jornalismo está monitorando, desde o dia 15 de agosto, contas de jornalistas, meios de comunicação e candidatos/as em 9 capitais do Brasil (Porto Velho/RO, Belém/PA, Fortaleza/CE, Maceió/AL, Cuiabá/MT, Rio de Janeiro/RJ, São Paulo/SP, Florianópolis/SC e Porto Alegre/RS), nas plataformas de redes sociais Instagram e X.

São registradas postagens com termos e hashtags ofensivas e estigmatizantes contra o trabalho da imprensa. Episódios de ataques e violações ao trabalho da imprensa fora das redes, no âmbito da cobertura eleitoral, também estão sendo acompanhados. A análise dos principais resultados do levantamento será publicada toda semana, até a realização do segundo turno. Ao final das eleições, um relatório consolidará a avaliação do período monitorado e trará recomendações às autoridades e plataformas digitais.

Integram a Coalizão em Defesa do Jornalismo (CDJor): Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), Ajor (Associação de Jornalismo Digital), Artigo 19, CPJ (Comitê para a Proteção de Jornalistas), Fenaj (Federação Nacional de Jornalistas), Instituto Palavra Aberta, Instituto Vladimir Herzog, Instituto Tornavoz, Intervozes, Jeduca (Associação de Jornalistas de Educação) e RSF (Repórteres Sem Fronteiras).