Manchete da edição de quinta-feira (27/1) do Estado de S.Paulocoloca em outros padrões o debate sobre a regulação da mídia no Brasil. O ponto principal da reportagem é a notícia de que o governo teria decidido abandonar a questão da propriedade cruzada dos meios de comunicação, pelo fato de que o desenvolvimento das tecnologias tornou obsoleto esse tema. O jornal lembra que a tendência de convergência das mídias, “que consolidou o tráfego simultâneo de dados e noticiário em todas as plataformas”, conduz a uma proposta de concessão única. A constatação, que parece óbvia, abre um enorme leque de outras divergências. Por exemplo, como conciliar a regulamentação das emissoras de televisão e rádio, serviços de concessão pública, com a liberdade dos sites, portais e outros formatos da internet, e com os veículos de papel, regidos por normas comerciais simples? Segundo a versão dada pelo Estadão, o ponto principal da mudança seria a determinação da presidente Dilma Rousseff para que a questão seja menos discutida em termos ideológicos e contemple mais os aspectos constitucionais e tecnológicos. Ameaça irreal Colocado no centro das discussões e do confronto com a mídia, Franklin Martins ficou marcado pelas acusações, feitas pela imprensa, de que pretenderia restringir a liberdade de informação. Embora nunca tenha havido um movimento real do governo anterior no sentido de estabelecer restrições para a imprensa, essa foi a imagem plantada pela mídia. Os jornais destacam ultimamente o compromisso formal da atual presidente com a liberdade de informação, como se o ex-presidente Lula da Silva tivesse representado um perigo para a imprensa. Da mesma forma, estendem um tapete vermelho para o atual ministro das Comunicações, forçando um contraponto com Franklin Martins que está apenas nos artigos e editoriais da imprensa. Nunca houve uma ameaça real à liberdade de imprensa durante o governo anterior. A tecnologia liberta Segundo o Estado de S.Paulo, a tendência é que essas questões sejam separadas entre si e tratadas isoladamente, para evitar desgastes para o governo. Existem ainda as questões da produção nacional, regional e independente, que o governo pretende estimular, e a regulamentação sobre a adequação de conteúdos. Como se pode perceber, embora o Estadão esteja comemorando discretamente uma alteração de rumos, ainda não se sabe onde essa mudança vai dar. O jornalão paulista aposta, por exemplo, o governo vai defender a extensão aos meios digitais do limite de 30% de capital estrangeiro, que hoje vigora para a mídia impressa, televisão e rádio. No entanto, a mesma tecnologia apontada como razão para se considerar superado o debate sobre a convergência de mídias impõe um olhar mais cuidadoso sobre a questão do capital estrangeiro nos meios digitais. Como impedir, por exemplo, que um portal noticioso seja criado na China, com conteúdo em português, com a mesma pauta dos jornais brasileiros? Além disso, já que, segundo o jornal, o governo está dando um passo atrás para planejar um movimento mais amplo, o que pode impedir um debate aberto e sem preconceitos sobre os fundamentos da limitação do capital estrangeiro em qualquer espécie de mídia? O mesmo argumento da tecnologia serve para o tema, uma vez que já existem aparelhos portáteis de comunicação capazes de acessar emissões multimídia, com som, imagem e texto, de qualquer lugar do mundo. Se é para abrir o leque, tudo deve ser questionado? Se a imprensa brasileira está pensando que a regulamentação vai consolidar privilégios, pode estar redondamente equivocada. * Articulista do Observatório da Imprensa
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