São 11 as datas-base dos 31 Sindicatos de Jornalistas filiados à FENAJ. Com esta diferenciação, quais os desafios para o desenvolvimento das campanhas salariais? Esta é uma das questões abordadas nesta entrevista por Ricardo Medeiros, presidente do Sindicato dos Jornalistas do Paraná. Déborah Lima, do Sindicato do Ceará, também convidada, não conseguiu responder às perguntas, pois viajou para participar do XV ENJAC.
Formado em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, em 1994, Ricardo já trabalhou na Folha de S.Paulo, Indústria & Comércio, Jornal do Estado e Primeira Hora. Ho_e atua na Gazeta do Povo, do Paraná. Vivenciando as dificuldades nas negociações com o patronato, ele fala da luta para assegurar salários e condições de trabalho dignos à categoria.
E-FENAJ – O andamento da campanha salarial no Paraná vem apontando dificuldades no processo negocial. A que você atribui isto?
Ricardo – Para os empresários representamos apenas despesas. No Paraná, os patrões se uniram para acabar com conquistas históricas da categoria. Algumas empresas contrataram “profissionais” de recursos humanos especializados em desmobilizar categorias. Esses “profissionais” usam estratégias baixas para quebrar resistências dentro das redações. O medo de demissão faz muita gente ficar calada, aceitando os prejuízos impostos. Na campanha salarial deste ano, por exemplo, os patrões radicalizaram e dizem que só aceitam negociar qualquer cláusula se acabarmos com o piso único no estado. Não aceitamos esta proposta indecorosa, pois os colegas do interior não são menos competentes do que os da capital para receberem menos e o custo de vida em muitas cidades interioranas é tão caro quanto Curitiba.
E-FENAJ – Contraditoriamente com o discurso dos patrões, alardeia-se que o país vive um momento de recuperação econômica e recentemente foram divulgados dados apontando que, a nível nacional, todos os segmentos de comunicação tiveram crescimento no seu faturamento publicitário. Porque só os empresários “comem o bolo”?
Ricardo – Os patrões são muito gulosos. Adoram cometer o pecado da gula e ficar com o bolo todo. Os patrões sempre alegam que o crescimento econômico do país não
reflete no nosso segmento, mas não é bem o que vemos. O que se vê é empresa aumentando o patrimônio, ampliando a operação em outros setores, os donos trocando de carro todo ano, viajando para o exterior, enquanto o jornalista precisa sobreviver com o seu salário.
E-FENAJ – Um dos elementos que dificultam as negociações atuais é a imposição de que a busca do arbitramento da Justiça do Trabalho só pode ocorrer se as duas partes (trabalhadores e patrões) concordarem em ir para dissídio. Há outros fatores conjunturais dificultando as campanhas salariais no momento?
Ricardo – Há muitos anos não vamos para o dissídio no Paraná. Apesar da exigência das duas partes terem que concordar com a arbitragem, não sei se teremos dificuldades em conseguir buscar na Justiça os nossos direitos. Acho um absurdo esta nova regra. Em relação a outros fatores conjunturais, vou dar mais um exemplo do Paraná. Os empresários do ramo dos jornais alegam que a baixa leitura faz com que o setor não cresça. Mas não se preocupam em tentar reverter o problema. Continuam usando as páginas dos jornais para atender interesses políticos e econômicos deles e de amigos. Para eles não interessa saber o que o leitor quer. Usam o jornal apenas para ter poder. Mas na hora de negociar, usam o velho problema da baixa leitura para dizer que não podem aceitar as nossas reivindicações.
E-FENAJ – Tradicionalmente, as campanhas salariais tem desenlaces diferenciados a depender do nível de mobilização dos trabalhadores. Como está a mobilização dos jornalistas em seu estado?
Ricardo – A categoria dos jornalistas não é a das mais mobilizadas, mas mesmo assim os patrões conseguem irritar tanto com o seu desprezo pelos nossos direitos, que conseguimos _eunir colegas na campanha.
E-FENAJ – Na sua avaliação, por quê entre os jornalistas parece haver maior dificuldade em utilizar formas mais radicalizadas de luta, como a greve, na defesa de suas legítimas reivindicações?
Ricardo – Nós cobrimos greves e outras manifestações de várias categorias, mas na hora de lutarmos por nossos direitos, não o fazemos. Talvez a nossa formação dificulte a visão de categoria e faça com que não sejamos corporativistas.
E-FENAJ – As campanhas salariais em vários estados têm peculiaridades como datas-bases e pisos diferentes e mesmo de segmentação da categoria. Isto não dificulta as negociações e o processo de mobilização?
Ricardo – No Paraná temos um piso único e a carga horária é de 5 horas. Este ano as
empresas querem estabelecer dois pisos e, também, criar uma carga horária de 7 horas. Não concordamos com isso, pois entendemos que só vai gerar desemprego. O impasse está dificultando a negociação.
E-FENAJ – Há alguns anos a FENAJ e os Sindicatos de Jornalistas buscaram a unificação das datas-base, pautas de reivindicações com algumas cláusulas comuns e mesmo o estabelecimento de um piso salarial nacional. Por quê isso não prosperou? É uma “missão impossível”? O que você aponta como fundamental para que nacionalmente a categoria avance em melhores condições de trabalho e salários mais dignos?
Ricardo – Acho que a unificação das datas-base e o estabelecimento de um piso
nacional seriam importantes, mas como costurar isso é que é difícil. São realidades diferentes. No Paraná temos um piso de R$ 1.617,56. Em alguns estados, os colegas recebem metade deste valor. Como convencer uma empresa a dobrar o salário? A saída, acredito, seja estabelecer um cronograma para que em alguns anos isto seja possível, mas vai demandar um esforço de negociação grande dos sindicatos e da FENAJ. Não podemos correr o risco que as conquistas sejam niveladas por baixo. Já a unificação das datas-base não acho tão difícil. Apesar dos pisos e datas-base diferentes, acho que uma campanha salarial nacional permanente ajudaria na mobilização da categoria, na troca de informações entre os sindicatos e na conquista de melhores condições de trabalho. Facilitaria o deslocamento de forças para regiões com dificuldades de negociação. Seria o início da unificação.
E-FENAJ – Obrigado Ricardo. O próximo convidado de nossa coletiva virtual é Luiz Spada, membro da Comissão Nacional de Ética dos Jornalistas. Ele abordará a ética no Jornalismo e os preparativos para o Encontro Nacional de Ética, que será realizado em Londrina (PR) em 2006. Os interessados em participar devem encaminhar suas perguntas paraboletim@fenaj.org.br até as 18 horas do dia 04 de outubro, especificando, na linha de assunto, “Entrevistas da FENAJ”.