Brigada Militar do RS é denunciada por agredir mulheres da Via Campesina

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A violência da Brigada Militar do Rio Grande do Sul na repressão a uma ocupação promovida pela Via Campesina, no dia 4 de março, chocou movimentos sociais e defensores dos direitos humanos. O caso teve repercussão internacional. Além de uma nota pública assinada por diversas entidades nacionais, entre elas a FENAJ, o Sindicato dos Jornalistas do RS também lançou documento oficial condenando a ação repressora, que impediu que repórteres cinematográficos e fotográficos cobrissem as agressões.

Na semana em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, a Via Campesina, organização formada principalmente por mulheres, promoveu uma ocupação na Fazenda Tarumã, em Rosário do Sul (RS), a 80 km da fronteira com o Uruguai. O objetivo do movimento foi denunciar ilegalidades cometidas pela multinacional finlandesa Stora Enso, que, inclusive, já haviam sido apontadas pelo Ministério Público Federal e INCRA no RS, como a aquisição de terras na faixa de fronteira do País sem a devida autorização do Conselho Nacional de Defesa.

Na ação repressiva, segundo as denúncias, “as militantes da Via Campesina foram duramente agredidas com socos, pontapés e golpes de cassetetes, tiveram armas apontadas para suas cabeças, ficaram privadas de água e alimentação e impedidas de alimentar suas crianças”.

O Sindicato dos Jornalistas do RS cobrou explicações das autoridades gaúchas, registrando que “Repórteres fotográficos e cinematográficos foram impedidos de registrar a agressão sofrida por mulheres e crianças que estavam na manifestação, inclusive tendo equipamentos profissionais apreendidos. Outra jornalista foi retirada do local pelos policiais”.

As agressões foram denunciadas por órgãos de defesa dos direitos humanos da Europa e América Latina. Veja, a seguir, as duas notas públicas emitidas sobre o caso.

Nota pública sobre violência da Policia Militar contra a Via Campesina em Rosário do Sul (RS)

Brasil, 05 de março de 2008.
A Relatoria Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada e Terra Rural, integrante da Plataforma DHESCA Brasil, juntamente com as organizações abaixo-assinadas, manifesta a sua solidariedade às militantes da Via Campesina que foram vítimas da truculência da Brigada Militar do Rio Grande do Sul nesta terça-feira, 04 de novembro.

A ocupação da Fazenda Tarumã por parte da Via Campesina em Rosário do Sul, município localizado a 80 quilômetros da fronteira com o Uruguai, foi completamente legítima para chamar a atenção das autoridades para as ilegalidades cometidas pela empresa finlandesa Stora Enso.

Esta multinacional, conforme apontam o Ministério Público Federal e o Instituto de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) daquele estado, desrespeita e burla a legislação brasileira ao adquirir terras na faixa de fronteira do País sem a devida autorização do Conselho Nacional de Defesa. Ademais, também utiliza artifícios espúrios, como a criação de uma empresa que serve de “laranja”, para garantir os seus objetivos.

Esta semana, mais uma vez o Brasil e o mundo tomam conhecimento dos métodos arbitrários – que muito lembram as práticas dos Estados fascistas que não respeitam direitos e garantias fundamentais – empregados pela Brigada Militar do Rio Grande do Sul para reagir à ação dos movimentos sociais que lutam por justiça social, que deveria ser garantida pelo mesmo Estado que os reprime com extrema violência. Tal violência, ressaltamos, tantas vezes repetida em Coqueiros do Sul, município no noroeste do mesmo estado, onde um imenso latifúndio (Fazenda Guerra) não cumpre o preceito constitucional da função social da propriedade, impede que centenas de famílias tenham o acesso à terra para dela tirarem seu sustento e garantirem sua dignidade e, ainda por cima, possui na sua área bases avançadas da Polícia Militar, caracterizando o uso do aparato público para fins privados.

Na ação em Rosário do Sul de denúncia contra a Stora Enso, as militantes da Via Campesina foram duramente agredidas com socos, pontapés e golpes de cassetetes, tiveram armas apontadas para suas cabeças, ficaram privadas de água e alimentação e impedidas de alimentar suas crianças. Como se não bastasse, a Brigada Militar também agrediu jornalistas, destruindo e confiscando seus equipamentos, e proibiu advogados da Via Campesina de exercerem sua função e acompanharem as ações policiais no interior da fazenda ocupada.

Infelizmente, a maior parte dos grandes meios de comunicação locais e nacionais legitima e justifica a violência praticada pelo Estado, em nome de uma ordem que privilegia um modelo de sociedade excludente, discriminatório e desigual em oportunidades.

Não há dúvidas de que a responsabilidade maior pelos referidos atos da Polícia Militar, que viola sistematicamente inúmeros direitos fundamentais, é da governadora Yeda Crusius e do Secretário de Segurança Pública, José Francisco Mallmann.

No ano em que se celebra o sexagésimo aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, cabe a eles, juntamente com as autoridades federais competentes, dar resposta à sociedade brasileira e internacional pelos abusos cometidos, bem como determinar investigação rigorosa para apontar os agentes passíveis de punição por tais atos.

Esperamos não menos do que isso e estaremos vigilantes e ativos no monitoramento do caso e na cobrança quanto às providências que cabem às autoridades do Rio Grande do Sul e do Brasil.

Atenciosamente,

– Relatoria Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada e Terra Rural
– Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (ABRANDH)
– Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia (CFP)
– Fala Preta – Organização de Mulheres Negras
– Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE)
– FIAN Brasil
– Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos (FENDH)
– Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (GAJOP)
– Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE)
– Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC)
– Instituto Povo do Cerrado
– Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
– Justiça Global
– Movimento de Mulheres Camponesas (MMC)
– Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)
– Plataforma DHESCA Brasil
– Relatoria Nacional para o Direito Humano à Moradia Adequada e Terra Urbana
– Movimento Nacional dos Pequenos Agricultores
– Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ)
– Associação Nacional dos Pequenos Agricultores
– João Alfredo Telles Melo, advogado, professor universitário, ex-deputado federal, consultor de políticas públicas do Greenpeace
– Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (FBSAN)
– Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida de Santa Catarina
– Movimento Luta FENAJ!
– Coletivo de Entidades Negras (RJ)
– Fórum Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional do Paraná (FESAN-PR)
– Fórum de Mulheres do Espírito Santo
– Comissão de Mulheres Indígenas Tupiniquim e Guarani
– Relatoria Nacional para o Direito Humano ao Meio Ambiente

Nota Oficial
Na semana em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul denuncia o impedimento, por parte da Brigada Militar, do exercício profissional de jornalistas na cobertura da ocupação, pelas mulheres da Via Campesina, da Fazenda Tarumã, em Rosário do Sul. Repórteres fotográficos e cinematográficos foram impedidos de registrar a agressão sofrida por mulheres e crianças que estavam na manifestação, inclusive tendo equipamentos profissionais apreendidos. Outra jornalista foi retirada do local pelos policiais.
Vivemos em uma sociedade democrática de direito e não vamos aceitar as velhas práticas do período da ditadura militar. O Código de Ética dos Jornalistas, em seu artigo 2º, inciso V, aponta que “a obstrução direta ou indireta à livre divulgação da informação, a aplicação de censura e a indução à auto-censura são delitos contra a sociedade”. O mesmo Código também identifica, no artigo 6º, ser “dever do profissional opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão”.

A Secretaria de Segurança do Estado deve explicações sobre esse fato não só aos jornalistas agredidos no seu direito de trabalhar, mas a toda a sociedade, que foi impedida de ser livremente informada. As constantes denúncias que chegam ao Sindicato revelam que ameaças aos jornalistas têm sido prática constante por parte da Brigada Militar.

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS está atento a esse tipo de comportamento e levará o caso à Federação de Periodistas da América Latina e Caribe que, já em sua Carta deLima, Peru, de dezembro de 2007, exigia dos governos assumir a responsabilidade de garantir a todos os jornalistas o direito à vida, ao trabalho digno, à liberdade de expressão e o direito cidadão à informação.

* Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS