Câmara de Ponta Grossa avança no Paraná ao manter Lei sobre exigência do diploma para Jornalistas

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* Hebe Gonçalves

A Câmara de Vereadores de Ponta Grossa se coloca como vanguarda no Estado do Paraná em defesa da exigência do diploma para o exercício da profissão de jornalista, com a derrubada do veto, na segunda-feira (12/03), do Executivo Municipal à Lei 10.858, de 21 de dezembro de 2011, que exige “diploma de Comunicação Social, habilitação em Jornalismo, aos profissionais contratados para o exercício de jornalista ou assessor de imprensa nos Poderes Legislativo e Executivo no Município de Ponta Grossa”. 

Por unanimidade, os vereadores confirmaram a posição da Casa, tomada já na aprovação do Projeto de Lei 203/2010, de autoria da vereadora Alina de Almeida Cesar, em que a mesma destaca a ?importância da imprensa e da profissão de Jornalista, função que deve ser exercida por profissionais tecnicamente preparados?. A decisão dos parlamentares demarca dois aspectos importantes para a Câmara de Vereadores em Ponta Grossa, os quais afetam diretamente a todos os cidadãos: a autonomia do Legislativo frente ao Executivo Municipal e o cumprimento de seu real papel em defesa dos interesses da sociedade. 

Já é de conhecimento e total compreensão que a campanha contra a exigência do diploma em Jornalismo para o exercício da profissão, encampada pelas grandes empresas de comunicação nacionais – leiam-se conglomerados de empresas de rádio, TV, jornais, revistas e internet, sediados no eixo Rio-São Paulo – e acatada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 17 de junho de 2009, atende aos interesses empresariais, com o propósito de desarticular uma categoria de profissionais, consolidada há mais de 100 anos. Perde o que se compreende, de fato, como bom jornalismo e toda sociedade. Um retrocesso, portanto! 

A luta pela regulamentação da profissão de jornalista no Brasil data do início do século XX, com a criação da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), em 1908, entidade composta por profissionais da imprensa, que, em 1918, realiza o I Congresso Nacional de Jornalistas. A luta da ABI, desde o seu início, perpassou pela criação das Escolas de Jornalismo, em defesa do ensino superior para a formação de novos profissionais. 

No País, a criação da Escola de Jornalismo ocorre de forma efetiva em 1935, mas teve curta duração, sendo fechada pelo Estado Novo, regime instaurado por Getúlio Vargas. Porém, o próprio Vargas instituiu por decreto, em maio de 1943, o Curso de Jornalismo da Faculdade Nacional de Filosofia, no Rio de Janeiro, mas que passou a funcionar somente em 1948. Em 1947, entrou em funcionamento o Curso de Jornalismo da Cásper Líbero, junto à Faculdade de Filosofia, ciências e Letras de São Bento, da Fundação São Paulo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 

Em 1958, este mesmo curso ganha autonomia e passa a denominar-se Faculdade Cásper Líbero. Em 1961, Luiz Beltrão cria o Curso de Jornalismo na Universidade Católica de Pernambuco. Em 1963, a Universidade de Brasília cria a Faculdade de Comunicação de Massa, sob a direção de Pompeu de Souza. Em 1966, foi a vez da criação da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo. 

A defesa da categoria pela criação das primeiras Escolas de Jornalismo não se encontra desassociada da luta pela regulamentação da profissão, ocorrida somente em 1969, com o Decreto Lei 972, de 17 de outubro daquele ano. Embora a regulamentação tenha sido posta pelo regime político considerado entre os mais duros da história deste País, para os profissionais e entidades representantes da categoria, o Decreto Lei representou uma grande conquista e resultado de uma luta iniciada por mais de 50 anos. Vale dizer que do mesmo Decreto Lei 972/1969 (modificado pela Lei 6.612/1978 e Decreto 83.284/1979) ainda em vigor, que regulamenta a profissão de jornalista, derrubou-se unicamente o Inciso V, do Art. 4, que prevê a exigência de “diploma de curso superior de jornalismo, oficial ou reconhecido registrado no Ministério da Educação e Cultura ou em instituição por este credenciada”. 

O que torna claro interesses de grupos empresariais tão somente pelo enfraquecimento da profissão, desmontando diretamente o princípio da qualidade, que perpassa pela formação superior em Jornalismo, sob o pífio argumento que a lei conteria em si ranços do regime militar. Ora, nada mais autoritário dizer, em plena segunda década do século XXI, que para atuar como jornalista dispensável a exigência da formação superior. 

Importante reforçar que dois Projetos de Emenda Constitucional aguardam para entrar em votação no Senado (PEC 33/2009) e na Câmara Federal (PEC 386/2009), ambos com pareceres favoráveis por Comissões Especiais, que incluem diversas áreas, inclusive a de Constituição, em ambas Casas. Ações que asseguram o reconhecimento da necessidade da formação superior em Jornalismo prestes a reverter a onda de ataques à profissão em nível nacional. 

Somada à luta em defesa da profissão, várias cidades já avançaram na questão, como Fortaleza, Belo Horizonte, Campina Grande, Natal e Maceió e Assembleias Legislativas do Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins, com a criação de lei que mantém a exigência de diploma para jornalistas nas instâncias dos Poderes Legislativo e Executivo. O que também passa a vigorar em Ponta Grossa, a partir da Lei 10.858, aprovada em dezembro passado e confirmada pela Câmara Municipal, com a derruba do veto do prefeito, Pedro Wosgrau Filho (PSDB), dia 12/03. 

A decisão dos vereadores de PG em derrubar o veto do Executivo, mantendo a lei em sua íntegra, foi recebida por representantes da categoria, professores e estudantes de Jornalismo, como uma vitória do jornalismo e da sociedade. No Brasil, somam-se aproximadamente 370 cursos de Jornalismo em nível superior. No Paraná, são 25 escolas; com aproximadamente 750 profissionais formandos por ano. Em Ponta Grossa, têm-se dois cursos de Jornalismo (Universidade Estadual de Ponta Grossa e Faculdade Santa Amélia – Secal). Com 26 anos de criação, o Curso de Jornalismo da UEPG conta também com um Programa de Especialização (Lato Sensu) em sua terceira edição e teve aprovado pela Capes, no início de março deste ano, o Programa de Mestrado em Jornalismo, o segundo do País em nível de pós-graduação (Stricto Sensu) na área, somando-se aos três programas de Pós-Graduação em Comunicação no Estado, dois em Curitiba (Universidade Tuiuti e UFPR) e um em Londrina (UEL), e demais dezenas em diversas Universidades do País.

Portanto, o debate sobre a exigência do diploma não se põe por encerrado. A Câmara de Vereadores de Ponta Grossa dá um importante passo, em defesa da qualidade do exercício da profissão de jornalista em nível dos poderes municipais (Executivo e Legislativo). “Precisamos melhorar a capacitação dos profissionais. Identifico com a luta de vocês”, a afirmativa da vereadora Alina aos estudantes e professores de Jornalismo da UEPG, presentes no Plenário da Câmara, no dia da votação, vai de encontro à luta secular da categoria, como defendido pelo representante maior da história da Associação Brasileira de Imprensa, Barbosa Lima Sobrinho, em sua obra clássica “O problema da imprensa” (Editora 1923) em que analisa a atuação da imprensa no Brasil. 

Da imprensa combativa ao jornal empresa, o autor reconhece que o “jornal deixou de ser pessoal. (…) Ele é empresa, essencialmente”. É neste sentido, a necessidade de uma regulação sobre a própria imprensa e não só sobre o jornalista isoladamente, conforme o combativo Lima Sobrinho: “Mas não basta uma lei. Há outros meios úteis. Os americanos instituem escolas de jornalismo [a primeira Escola de Jornalismo nos Estados Unidos foi criada em 1908 na Universidade de Missouri] para o preparo de profissionais competentes, uma vez que à ignorância cabe tanta parte de culpa dos males da imprensa”. Continuamos agora para que a iniciativa de Ponta Grossa seja tomada como modelo por demais cidades, em nível de Estado e Brasil, por entendermos a informação como um bem, que afeta diretamente a toda sociedade. 

* Jornalista formada pela UFJF, doutora em Ciências da Comunicação pela Unisinos, professora do Curso de Jornalismo da UEPG, desde 2003, e coordenadora da Especialização Mídia, Política e Atores Sociais da mesma Instituição.