Profissionais, professores e pesquisadores de Jornalismo estão bem articulados

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Estamos chegando ao final de 2005. Elias Machado, presidente da SBPJor, aborda, nesta coletiva virtual, algumas das ações dos jornalistas neste ano, como as lutas pela valorização da profissão, o combate e fiscalização de irregularidades, o retorno do diploma como requisito para o exercício do jornalismo, a alteração da proposta de TAC que o reduzia a especialidade e o debate em torno da Reforma Universitária. 

Ele é jornalista e doutor em Jornalismo pela Universidade Autônoma de Barcelona, na Espanha. É um dos pioneiros na pesquisa em jornalismo digital no Brasil e trabalha como pesquisador no Grupo de Pesquisa em Jornalismo On-line da Universidade Federal da Bahia (www.facom.ufba.br) desde 1995. Atualmente é o presidente da Sociedade Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor –http://www.sbpjor.org.br).


E-FENAJ – Bem, vamos começar abordando o III Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo, que acontece na UFSC, em Florianópolis, de 27 a 29 de novembro. Segundo a própria SBPJor noticiou, este encontro terá um número recorde de trabalhos a serem apresentados e será prestigiado por pesquisadores de renome internacional. Como o período de inscrições para participar do evento terminou no dia 15 de novembro – desfecho de um feriadão – não há perspectiva de prorrogação das inscrições? E qual sua expectativa para este Encontro?

Elias Machado – O fechamento antecipado das inscrições ocorre por uma necessidade de logística para produzir o material distribuído aos participantes. Em todo caso, faremos uma avaliação geral nesta quinta-feira e, considerando que estamos recebendo muitos pedidos para a prorrogação, existe sim a possibilidade de ampliarmos a data para as inscrições. Depende de uma discussão da viabilidade da medida com a Comissão Organizadora local.

Nossa expectativa para o encontro é a melhor possível. Teremos um recorde de trabalhos selecionados para apresentação, 129, todos aprovados por ao menos dois doutores especializados no tema. Na conferência de abertura contaremos com três dentre os mais conceituados pesquisadores internacionais sobre o jornalismo, Nelson Traquina, de Portugal; Thomas Hanitszch, da Alemanha e Javier Diaz Noci, do Pais Basco, na Espanha. Todos com larga experiência como jornalistas profissionais.

Pela segunda vez consecutiva contaremos com a participação das principais agências de apoio à ciência e tecnologia no país e em Santa Catarina, CNPq, CAPES, com o patrocínio da Petrobrás e, a nível local, com a parceria do Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina, da Pós-Graduação em Jornalismo da UFSC, da CELESC, do Governo do Estado e da Prefeitura Municipal. Para reforçar nossa articulação com as entidades do campo do jornalismo, mais uma vez, convidamos para a abertura o_presidente da FENAJ, Sérgio Murillo, e do Fórum Nacional dos Professores de Jornalismo, Gerson Martins.

E-FENAJ – A eleição da nova diretoria da SBPJor será numa assembléia durante o III Encontro. Uma única chapa se inscreveu e você é candidato a reeleição para presidente da entidade. Programaticamente falando, que ações prioritárias da SBPJor para o próximo período a chapa defende?

Elias Machado – A inscrição de uma chapa apenas reflete o clima de trabalho colegiado que imprimimos na SBPJor. Felizmente, conseguimos cumprir com todas as metas estabelecidas quando do lançamento da entidade, em novembro de 2003, em Brasília. Saltamos de 94 sócios para 170, 84 deles com doutorado. Lançamos a Brazilian Journalism Research, a primeira revista científica totalmente editada em inglês no campo da comunicação no Brasil e obtivemos o reconhecimento das principais agências de fomento à pesquisa científica no país como CAPES, CNPq, FAPESB, FAPESC, entre outras.

A principal prioridade nesta segunda gestão, se formos reeleitos, será a plena institucionalização da pesquisa em jornalismo, com o apoio para a criação de cursos de mestrado e doutorado em jornalismo, estímulo à abertura de linhas de pesquisa em jornalismo nos programas de pós-graduação em comunicação e à formação de redes interinstitucionais de pesquisa em jornalismo (regionais, nacionais e internacionais). Uma segunda meta será a internacionalização dos trabalhos desenvolvidos pelos pesquisadores brasileiros, até aqui muito pouco conhecidos fora do país, com uma ampliação da circulação da Brazilian Journalism Research e a organização da Brazil Conference, que permitirá a vinda ao Brasil de grandes nomes da pesquisa em jornalismo dos cinco continentes.

Uma terceira prioridade será na parte administrativa com a automatização de toda a parte administrativa e das atividades de atualização e produção do sítio web da SBPJor e da Brazilian Journalism Research. Com a automatização conseguiremos uma relação melhor com os sócios e otimizaremos o tempo destinado aos trabalhos de gestão, garantindo muito mais eficiência em nossos trabalhos.

E-FENAJ – O interesse que este III Encontro Nacional da SBPJor vem despertando é uma demonstração do crescimento do Jornalismo como área de conhecimento e pesquisa. No entanto, num sentido oposto, a Comissão CAPES/CNPq/FINEP propôs a redução do Jornalismo na Tabela de Áreas de Conhecimento (TAC) à condição de especialidade. Isto não é um contra-senso? Felizmente a reação das entidades do campo do Jornalismo foi vigorosa e apresentou-se uma proposta consensual para superar este impasse. Esperava-se para o dia 16 de novembro uma posição oficial sobre esta proposta. Ela já é conhecida e satisfatória?

Elias Machado – Até o momento, não recebemos nenhum retorno do presidente da Comissão Especial CNPq/CAPES/FINEP, encarregada de reestruturar a Tabela das Áreas de Conhecimento, Manuel Domingos Neto. Na reunião que mantivemos no CNPq em outubro, o professor Domingos garantiu que a proposta enviada pelo campo do jornalismo seria acolhida desta vez.

Como cumprimos com nossa parte no acordo – enviamos uma proposta consensual dentro do campo da comunicação, reduzindo as subáreas para seis como nos fora solicitado – esperamos que a nova versão da Tabela incorpore o jornalismo _omo uma subárea de conhecimento, reconhecendo a tradição epistemológica de nosso campo. O fato de termos enviado uma única proposta reflete uma maturidade da área, que conseguiu perceber que, do ponto de vista estratégico, a valorização das nossas especificidades contribui para que a comunicação no futuro se transforme em uma Grande Área de Conhecimento.

Particularmente, não tenho a menor dúvida que se não estivéssemos organizados com a SBPJor e articulados com a FENAJ e o Fórum Nacional de Professores de Jornalismo, muito provavelmente o jornalismo desapareceria da futura Tabela como subárea. Felizmente conseguimos dar uma resposta imediata – em menos de uma semana os membros da Comissão CNPq/CAPES/FINEP receberam mais de três mil mensagens de e-mail e, mais importante, ao final contribuímos de forma decisiva para fortalecer a área como um todo.

E-FENAJ – Vamos falar um pouco sobre o ensino de Jornalismo, a questão do diploma e o exercício profissional. A decisão do TRF-3º Região resgatou o diploma como requisito fundamental para o exercício da profissão. Isto, ao mesmo tempo em que fortalece o papel das faculdades, também amplia sua responsabilidade na formação de jornalistas. Qual sua avaliação sobre a qualidade dos cursos de Jornalismo no país? Esta ampliação do número de cursos de jornalismo que se verifica no Brasil, principalmente privados e nos últimos dez anos, não repercute negativamente na qualidade da formação e no próprio mercado de trabalho? O que você acha da proposta da FENAJ de uma “moratória” na abertura de novos cursos para que se faça uma avaliação mais criteriosa? Até o momento o MEC não se posicionou sobre esta proposta de nossa Federação.

Elias Machado – A diversidade de situações caracteriza o ensino de jornalismo em nosso país – indo desde universidades de ponta, com excelentes cursos, até faculdades sem a menor possibilidade de oferecer uma formação adequada. A proliferação de escolas esbarra na falta de professores qualificados e, muitas vezes, na ausência de condições mínimas de estrutura necessárias para a prática do trabalho docente e de aprendizagem.

A fiscalização da parte do MEC continua deixando a desejar, mas é bom que se diga que, às vezes, o funcionamento de cursos em uma situação precária depende do grau de exigência das comissões avaliadoras. Pela atual legislação, nenhum curso pode ser aberto e funcionar sem ser submetido à avaliação de comissões formadas por professores de jornalismo, na sua maioria mestres e doutores, designados pelo MEC.

A moratória na abertura dos cursos pode ser uma boa medida se for pensada como uma etapa para que se possa criar as condições adequadas para estabelecer normas consensuais de funcionamento dos cursos. Particularmente, em um país como o nosso, de dimensões continentais, existe sim lugar para novos cursos, principalmente em cidades do interior e em estados do Norte e Nordeste. O que se deveria era ter o cuidado de garantir a abertura de cursos em lugares em que são necessários e com as condições mínimas indispensáveis para uma formação de qualidade. Até aqui as escolas de formação de jornalistas estão muito concentradas nas grandes cidades e no centro sul do país, além de oferecerem cursos muito similares, deixando de aproveitar a vocação local como estímulo para especializa&cced_l;ões.

E-FENAJ – E a reforma universitária, que corre o risco de não sair do papel pelo menos no atual governo? As entidades do campo do Jornalismo também buscaram interferir para alterar a proposta do MEC. Você acha que este diálogo foi positivo? As contribuições de nossas entidades foram incorporadas no anteprojeto? Como fica este debate daqui para frente?

Elias Machado – A proposta do MEC recebeu parecer desfavorável do Ministério da Fazenda e deverá ser refeita porque, como apontávamos em reunião com o Secretário Executivo do Ministério, Jairo Jorge, em agosto, como estava o projeto era inexeqüível por falta de recursos orçamentários. Provavelmente, a julgar pelo ritmo atual dos trabalhos no Congresso Nacional, a proposta deva ficar para a próxima legislatura, a depender do resultado das eleições de 2006.

Não tenho dúvidas que o diálogo das entidades do campo do jornalismo (FENAJ, SBPJor e FNPJ) com o MEC, como instituição, representou uma qualificação nas nossas relações, como o próprio ministério reconheceu, nos recebendo várias vezes para conversar sobre nossas contribuições. Lamentavelmente, a abertura do MEC para a discussão não se traduziu em incorporar, ao menos em parte, as nossas sugestões na versão final encaminhada para a Casa Civil e que agora deve ser refeita para atender as orientações do Ministério da Fazenda.

Para as três entidades do campo o anteprojeto atual propõe mudanças que irão prejudicar a qualidade da formação profissional no campo do jornalismo. Por um lado, porque prevê a redução no tempo dos cursos e a imposição do chamado ciclo básico, de dois anos. E, por outro, porque deixa intactas estruturas que deveriam ser mais democratizadas como o Conselho Nacional de Educação e a Comissão Nacional de Avaliação, totalmente controladas pelo Governo Federal. Nestes órgãos todos os membros são nomeados pelo presidente da República ou pelo Ministro da Educação, inclusive os chamados representantes da sociedade civil.

Existe um consenso entre as três entidades do campo do jornalismo de que deveremos acompanhar o processo de discussão da reforma e interferir, se necessário for no Congresso Nacional, para que seja garantida a formação com qualidade. Ao longo destes últimos dois anos acumulamos uma discussão que, não tenho dúvidas, possibilita que possamos estabelecer um diálogo de alto nível seja com o Ministério, seja com os membros do Congresso Nacional. No que depender da SBPJor daremos continuidade ao belo trabalho de parceria que realizamos com a FENAJ e o FNPJ.

E-FENAJ – O Luiz Fernando Fonteque, estudante de Jornalismo em Goiânia, manifesta preocupação quanto à continuidade dos precários ocupando espaço nos meios de comunicação. Segundo ele, há precários inclusive dando aula em cursos de Jornalismo. Ele quer saber como a SBPjor vai agir junto às DRT’s para coibir a ação dos precários que estão no mercado? E as empresas, como devem agir nessa situação? Pergunta, ainda, quais as atitudes cabíveis no combate a esta atuação irregular?

Elias Machado – Em primeiro lugar, cabe deixar claro que, dentro do campo do jornalismo cada uma das entidades tem uma função específica. A SBPJor prioriza à pesquisa; o FNPJ o ensino e a FENAJ o exercício da prática profissional. Na medida do possível as três entidades têm trabalhado e, ao meu ver, devem continuar atuando em conjunto porque muitas das questões que preocupam os membros das associações são de interesse mútuo.

No caso específico da fiscalização do exercício ilegal da profissão, uma atitude por si só condenável porque representa ação ilegal submetida à sanção penal, cabe a FENAJ, como já está fazendo, cobrar medidas do Ministério do Trabalho. Se souber que em um curso de jornalismo existe professor sem a devida habilitação, cabe a qualquer profissional denunciar a situação. Somente com a participação de cada um de nós, seja membro da SBPJor, da FENAJ ou do FNPJ conseguiremos que a prática profissional, seja nas redações ou nas salas de aula, seja exercida por quem reunir a capacitação específica exigida por lei.

E-FENAJ – Harold Fidler, estudante de Jornalismo em Nova Santa Rosa (PR), reproduziu um trecho de nossa última coletiva virtual, onde o advogado João Piza, respondendo a uma pergunta sobre os argumentos que usou para defender a constitucionalidade do diploma de Jornalista no TRT-3º Região, sustentou que “O Decreto n.º 83.284, de 13 de março de 1979, deu nova regulamentação ao Decreto-Lei n.º 972/69, disciplinando também que o jornalista deverá ser diplomado em curso superior de jornalismo ou de comunicação social para o exercício da profissão”. A partir desta leitura, o Harold ficou com dúvidas: com base no Decreto n.º 83.284, de 13 de março de 1979 o Publicitário e o Relações Públicas também podem trabalhar como jornalista? O exercício do jornalismo não é único e exclusivamente do jornalista?

Elias Machado – Na forma da lei somente pode exercer a profissão o formado em jornalismo. O que pode parecer uma redação ambígua, na verdade, existe para atender ao modo como são estruturadas as carreiras na universidade. Ocorre que, desde o final dos anos 60, em nosso país, na maioria dos casos, os futuros jornalistas são formados em cursos de comunicação, com habilitação em jornalismo. Raros são os casos, como o de Santa Catarina, por exemplo, em que existe um departamento de jornalismo que oferece uma graduação em jornalismo. Se alguém formado em RP ou Publicidade for à DRT para tentar obter o registro profissional terá o pedido negado porque para que possa se registrar exige-se apresentação do diploma de bacharel em jornalismo ou em comunicação social, com habilitação em jornalismo.

E-FENAJ – Bom, finalizando nossa conversa, qual o seu balanço da intervenção conjunta das entidades do campo do Jornalismo – principalmente FENAJ e Sindicatos, SBPJor e FNPJ – em 2005? E que novas iniciativas você propõe para fortalecer as relações entre a SBPJor e a FENAJ?

Elias Machado – Até parece um sonho. Felizmente não é. Nunca como hoje os profissionais, os professores e os pesquisadores estiveram tão articulados, conseguindo superar barreiras históricas de mútuo preconceito. Ao longo dos últimos dois anos nossa parceria com a FENAJ e o FNPJ foi a melhor possível. Estivemos juntos em várias frentes como a reforma universitária, a defesa da incorporação do jornalismo como subárea de conhecimento e na defesa da formação específica.

Antes mesmo de fecharmos o acordo para a atuação conjunta nestas questões, no começo de 2004 havíamos discutido_a possibilidade de institucionalizarmos a relação entre as três entidades através de ações concretas. Além de seguirmos de perto os desdobramentos da reforma universitária, para 2005, estamos em tratativas para a realização pelas três entidades de um seminário nacional sobre os principais desafios contemporâneos para o jornalismo como prática profissional, área especializada de ensino e campo de conhecimento científico.

E-FENAJ – Obrigado por sua participação Elias. Desejamos sucesso no III Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo e no seu trabalho na SBPJor. Nossa próxima coletiva virtual será disponibilizada no dia 1º de dezembro. O convidado é Aziz Filho, presidente do Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro, que falará sobre os riscos inerentes à profissão, políticas de proteção e segurança dos jornalistas e sobre a necessária participação da categoria no cotidiano dos sindicatos. Para participar, encaminhe perguntas paraboletim@fenaj.org.br até as 18 horas do dia 29 de novembro, especificando, na linha de assunto, “Entrevistas da FENAJ”.