TV Globo 60 anos: o jornalismo virou referência, mas às custas da precarização de quem o faz

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Hoje, 26 de abril de 2025, a TV Globo completa 60 anos de atuação. Não se trata de uma data qualquer. Trata-se da consolidação de um dos maiores conglomerados de comunicação da América Latina e da empresa que definiu, com todas as suas virtudes e contradições, um modelo de jornalismo que se tornou referência nacional e internacional.

Mas nenhum marco histórico é completo sem memória e sem justiça.

A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e os Sindicatos de Jornalistas profissionais de todo o Brasil vêm a público afirmar: os 60 anos da Globo foram construídos pela inteligência, coragem e comprometimento de repórteres, editores, repórteres cinematográficos, produtores e tantos outros profissionais que sustentam a engrenagem do jornalismo na emissora. A solidez da informação, o respeito do público e o impacto das coberturas que marcaram a história do país têm uma origem clara: a força de trabalho jornalística, que permanece até hoje sendo negligenciada e precarizada.

A história da Globo começou em 1965, no auge da Ditadura Civil-Militar. A emissora foi fundada em um contexto de cerceamento da liberdade de imprensa, perseguição a jornalistas e intervenção direta do Estado nas entidades sindicais da categoria. Como mostrou Daniel Herz em A História Secreta da Rede Globo, a empresa cresceu com o apoio de estruturas autoritárias e com uma lógica de concentração de poder e concessões que favoreceu seu monopólio.

Durante anos silenciou sobre as violações de direitos humanos do regime militar, contribuindo para o apagamento da história real do país.

Também no plano das relações de trabalho, os embates são antigos. Na histórica greve de 1979, em São Paulo, jornalistas da Globo aderiram à paralisação por dignidade salarial e foram demitidos como forma de retaliação. Desde então, a emissora tem adotado uma postura que, em muitas ocasiões, resiste ao diálogo com os sindicatos e trata com desdém as pautas coletivas da categoria.

Por décadas as campanhas salariais enfrentaram recusa de negociação direta, congelamento de cláusulas sociais, ataques a direitos previstos em lei — como a jornada de 5 horas — e práticas recorrentes de sobrecarga, acúmulo de funções, terceirização indevida e assédio moral. Muitas redações convivem com o medo permanente de cortes e com a falta de canais seguros para denúncias. Mais recentemente, os sindicatos denunciaram demissões em massa promovidas durante assembleias salariais, afetando, em especial, profissionais mais velhos, com décadas de experiência.

Outro episódio que marca o distanciamento da empresa em relação à valorização profissional foi sua atuação ativa pela retirada da exigência do diploma de jornalismo como critério de acesso à profissão. Ao apoiar a decisão do Supremo Tribunal Federal, em 2009, que derrubou essa exigência, a TV Globo posicionou-se frontalmente contra a defesa da formação técnica e ética da categoria — uma bandeira histórica da FENAJ e de seus sindicatos filiados.

Apesar de ser uma das maiores empregadoras de jornalistas do país, a emissora segue negligenciando as condições de trabalho e se recusando a firmar convenções coletivas que contemplem avanços. A instabilidade, a sobrecarga e o adoecimento vêm crescendo nas redações. Em 2023, denúncias graves de assédio moral, sexual e discriminação impulsionaram protestos internos, especialmente liderados por mulheres, num movimento espontâneo por ambientes mais seguros e humanizados.

Por tudo isso, os 60 anos da TV Globo não podem ser comemorados sem o devido reconhecimento de quem, de fato, ergueu essa história: os trabalhadores do jornalismo. Aqueles que narraram o Brasil para o Brasil — muitas vezes contrariando pressões, resistindo a tentativas de manipulação e enfrentando estruturas que silenciam os próprios narradores.

A TV Globo celebra 60 anos de uma história que ajudou a moldar o jornalismo no Brasil. Que essa celebração não ignore quem tornou tudo isso possível. Só haverá orgulho legítimo quando vier acompanhado de reconhecimento, valorização e respeito aos profissionais que, com seu talento e trabalho diário, construíram cada capítulo dessa trajetória.

É hora de mudar. A FENAJ e os Sindicatos de Jornalistas reivindicam:
• Respeito à jornada legal de 5 horas diárias, com a valorização efetiva de todas as funções jornalísticas;
• Reposição das perdas salariais acumuladas nos últimos anos e reajustes com ganho real;
• Estabilidade nas redações, fim das demissões arbitrárias e das práticas etaristas;
• Fortalecimento de políticas de prevenção ao assédio e à violência institucional;
• Reconhecimento das entidades sindicais como legítimas interlocutoras nas negociações coletivas;
• Apoio público à exigência de formação específica para o exercício do jornalismo.

Brasília, 26 de abril de 2025

FENAJ – Federação Nacional dos Jornalistas

Sindicatos de Jornalistas Profissionais filiados em todo o Brasil