Realizado de 26 a 28 de maio nas dependências do Congresso Nacional, em Brasília, o 2º Fórum Nacional de TVs Públicas terminou sob a promessa do presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), de que a regulamentação do sistema público de televisão terá prioridade no Congresso, caso seja encaminhado na forma de um projeto de lei. A Carta de Brasília reafirmou o compromisso das entidades promotoras do evento (Abepec, ABTU, ABCCOM e Astral) e suas filiadas com a democratização da comunicação no Brasil. Ao afirmar seu compromisso com a regulamentação das TVs públicas, Temer destacou a necessidade de tal proposição ser apresentada como um projeto de lei para ser votado com urgência urgentíssima. “Assim, no prazo de dez, dias isso pode estar concluído”, disse. A mesa de encerramento do Fórum reuniu, além do presidente da Câmara, os ministros Franklin Martins, da Comunicação Social, e Juca Ferreira, da Cultura, o senador Renato Casagrande (PSB-ES), representando o presidente do Senado, José Sarney, o consultor jurídico do Ministério das Comunicações, Marcelo Bechara (representando o ministro Hélio Costa), e o presidente da Ancine, Manoel Rangel. Antes mesmo de iniciar a leitura das conclusões do encontro, a presidente da EBC, jornalista Tereza Cruvinel, conclamou: “Aproveitando que estamos na casa do Poder Legislativo, eu peço aos parlamentares presentes: temos de acabar com um filhote da ditadura que ainda persiste, que é o Decreto-lei 236, de 1967”. O ministro Franklin Martins se disse feliz com os resultados do 2º Fórum Nacional de TVs Públicas e, ao comentar as possibilidades de fontes de financiamento para o setor, avisou que não vê problemas em destinar, legalmente, percentuais de propaganda institucional do governo para as emissoras públicas. O ministro salientou que, agora, o momento é de cuidar da qualidade da programação. Relator do projeto de lei que criou a EBC, o senador Renato Casagrande colocou-se à disposição para levar o debate sobre a regulamentação do campo público para dentro do Senado. O ministro da Cultura, Juca Ferreira ressaltou que, enquanto o 1º Fórum Nacional de TVs Públicas teve caráter de ato heróico e desbravador de territórios, este 2º Fórum foi o momento de consolidar avanços e fez votos para que o Congresso Nacional aprove a regulamentação dos artigos. Juca Ferreira também manifestou-se a favor do desenvolvimento do Instituto de Comunicação Pública com padrão diferente de análise de audiência para o setor público de televisão. Manoel Rangel, presidente da Ancine, reiterou a importância da parceria do cinema brasileiro com a televisão pública e disse que a Agência está aberta ao diálogo e à cooperação com as emissoras públicas de televisão. “Vamos encarar juntos o desafio da programação. Contem com a Ancine”. Veja, a seguir, a íntegra do documento final do evento. Carta de Brasília II O 2º Fórum Nacional de TVs Públicas, ancorado pela Carta de Brasília, afirma seu compromisso com o processo de democratização da comunicação social brasileira. Visando a conquista de um campo público de televisão editorialmente independente, que estimule a formação crítica do indivíduo para o exercício da cidadania e da democracia, o II Fórum apresenta uma série de propostas e reivindicações. Essas deliberações têm, principalmente, o objetivo de estabelecer alianças e compromissos com os cidadãos brasileiros, razão de sua existência. Organizado pelas entidades do campo público de televisão, o 2º Fórum contou com a participação de representantes do Governo Federal, do Parlamento e da sociedade civil. A partir das contribuições aos temas em debate, dadas presencialmente ou enviadas por Internet, o II Fórum Nacional de TVs Públicas chegou aos seguintes consensos: REGULAMENTAÇÃO O artigo 223, ao mencionar que existe um sistema público, um estatal e um privado está estabelecendo três categorias diferentes não estanques, não antagônicas, mas três categorias diferentes que têm de ser distinguidas por algum critério; atuar de forma complementar é a prescrição da Constituição. Ao contribuir para a regulamentação dos artigos constitucionais referentes a essa matéria, o 2º Fórum interpreta que há um sistema de radiodifusão privado, com fins lucrativos e que deve, como os demais sistemas, obedecer aos princípios do artigo 221 de modo preferencial. Entende que há um sistema de radiodifusão público, que é estatal, não tem fins lucrativos e obedece, com exclusividade e não preferencialmente, aos princípios do artigo 221 e da lei 11652. Sua programação está voltada à divulgação e transparência dos atos institucionais e à prestação de contas da administração pública em suas três esferas de poder: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. O 2º Fórum entende ainda que há um sistema de radiodifusão público não-estatal que opera sem intenção de lucro, que deve obediência exclusiva aos princípios do artigo 221, que deve observar os princípios e objetivos contidos na Lei 11.652, que já vigoram para regular o sistema público de comunicação em âmbito nacional. A diferença fundamental entre os dois sistemas é que, no sistema de radiodifusão público não-estatal, as diretrizes de gestão da programação e a fiscalização devem ser atribuição de órgão colegiado deliberativo, representativo da sociedade, no qual o Estado ou o governo não devem ter maioria. Em função dessa conceituação, o II Fórum Nacional de TVs Públicas deliberou pela: 1) alteração imediata, por medida provisória dada sua relevância e urgência, do artigo 13 parágrafo único do Decreto Lei 236 de 28 de fevereiro de 1967; 2) edição simultânea de uma portaria interministerial, definindo os objetivos e princípios da radiodifusão pública, exploradas por entidades públicas ou privadas, que não o poder executivo federal ou de entidades de sua administração indireta. FINANCIAMENTO – a não exibição de publicidade de produto ou serviço em todas e qualquer uma das emissoras públicas estatais e não-estatais; – a criação de modelos de financiamento estáveis e integrados para todo o campo público de televisão; – promover mecanismos entre produtoras independentes, TVs Públicas, Ministério da Cultura e Agencia Nacional de Cinema (Ancine) visando a criação de modelos de negócios que utilizem instrumentos de fomento para a produção independente em TV. O 2º Fórum reconhece que o modelo de financiamento da EBC é uma referência importante para as TVs Públicas quanto às possibilidades de diversificação de suas fontes de financiamento. E reivindica: – participação de todas as emissoras que compõem o campo público de televisão nos recursos provenientes da Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública; – repasse de um percentual de publicidade pública institucional do Governo Federal às emissoras que compõem a Associação Brasileira de Canais Comunitários (ABCCOM). MIGRAÇÃO DOS CANAIS PÚBLICOS DO CABO PARA REDES DIGITAIS ABERTAS – que o Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre (SBTVD-T), incorpore os canais comunitários e universitários como players devidamente identificados no texto da Lei, disciplinando sua operação nos mesmos moldes previstos na Lei do Cabo; – que se garanta o acesso das TVs Comunitárias e das TVs Universitárias ao espectro da TV Digital Aberta Terrestre, com possibilidade de utilização de todas as funcionalidades da tecnologia: interatividade, multiprogramação, mobilidade e multiserviço. – que as TVs Comunitárias tenham assegurada sua participação no novo Canal da Cidadania, como determinado no Decreto 5.820; – que seja incluído um inciso adicional no artigo 3º do Projeto de Lei 277/2007 prevendo o Canal da Universidade, com gestão conjunta, autônoma e isonômica por instituições de ensino superior, autorizadas a funcionar pelo Ministério da Educação, as quais responsabilizar-se-ão por transmitir programação decorrente das produções realizadas por discentes, docentes e colaboradores das referidas instituições de ensino. OPERADOR ÚNICO DE REDE E MULTIPROGRAMAÇÃO – um operador de rede pública único que congregue todas as emissoras de televisão do campo público de entidades públicas e privadas; – que todas as emissoras do campo público de televisão tenham assegurado o direito à multiprogramacão e à interatividade para a ampliação da transmissão e recepção de conteúdos que venham, de fato, a colaborar para a construção da cidadania no Brasil. PROGRAMAÇÃO DE TV PÚBLICA – Formação e qualificação técnica e em gestão dos profissionais de comunicação e telecomunicação do campo público de televisão; – Fomento à estruturação de grupos de trabalho permanente, com formato de laboratório e participação de todas as vertentes do campo público de televisão, para a realização de pesquisa e desenvolvimento em inovação de linguagem, em conteúdos para convergência digital, criação de novos formatos de programação elaborados a partir das possibilidades interativas do público com a TV digital, multiprogramação, acessibilidade e usabilidade do controle remoto usado como miniteclado; – Fomento à produção independente, através da construção compartilhada com produtoras independentes, TVs Públicas, Ministério da Cultura, por meio da Secretaria do Audiovisual, e Agencia Nacional de Cinema (Ancine) de editais públicos específicos que considerem a vocação do campo público de televisão; – Fomento à produção cidadã, de conteúdos realizados diretamente pela sociedade, mediante a incorporação de modelos de produção audiovisual baseados na cultura colaborativa, compartilhada e participativa. Fortalecimento e abertura de espaços para a veiculação dessas produções nas TVs do campo público, além da implementação de políticas de estímulo e fomento a esses modelos de produção, nos moldes do item anterior; – realização de inventário, digitalização e disponibilização de acervos locais existentes; O 2º Fórum também afirma seu compromisso com: – a realização de estudo específico para a regulamentação da distribuição e do licenciamento de programas e produtos da TV Pública, no novo contexto tecnológico. Por fim, o 2º Fórum reafirma que o Cinema Brasileiro é um parceiro estratégico para a realização da missão do campo público de televisão e manifesta a importância de se celebrar um acordo colaborativo, por meio de bases sólidas, entre a TV Pública e o Cinema Nacional. INSTITUTO DE COMUNICAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA – coordenará o levantamento do conhecimento e experimentações produzidas pelas TVs Públicas, universidades e instituições de pesquisa; – funcionará como um ambiente de discussão permanente para a repercussão e continuidade das reflexões que buscam configurar o campo público brasileiro de televisão; – abrigará laboratórios, desenhados para refletir, pesquisar, avaliar e inovar sobre as questões centrais na construção dos modelos de comunicação desejados pelo campo público de televisão; – estabelecerá parcerias com universidades e instituições de ensino, pesquisa e produção, nacionais e internacionais. – trabalhará como agente crítico dos caminhos propostos para o campo público de televisão; – atuará no desenvolvimento de novas metodologias de análise de aferição de performance e qualidade que atendam aos princípios e objetivos para o qual a TV Pública foi criada; – colaborará no desenvolvimento de informações e ferramentas para a prestação de contas junto à sociedade e seus patrocinadores. A criação de um instituto de comunicação pública brasileira representa um importante suporte para que a TV Pública ponha-se à mostra, com consciência, sem medo de ousar. Assim, o 2º Fórum encarece, desde já, o apoio do Governo Federal e do Parlamento para a implementação desse instituto. Os avanços propostos pelo 2º Fórum Nacional de TVs Públicas revelam que o processo de construção do campo publico de televisão e de sua identidade, especialmente no contexto da tecnologia digital, é uma oportunidade histórica determinante para despertar na sociedade o sentimento de pertencimento dessa TV pelo público e do público por essa TV. Brasília
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