Sem diploma, com jagunços

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* Leandro Fortes

É incrível o grau de desonestidade intelectual dessa discussão. E não me refiro apenas a esse inacreditável artigo de um blogueiro da Veja, mal repercutido no Blog do Noblat.

A obrigatoriedade do diploma para atuar como jornalista NADA tem a ver com liberdade de expressão, muito menos de imprensa. É uma garantia de qualidade na formação do jornalista e um filtro importante para a reportagem em veículos de imprensa. 

Ricardo Setti cita o exemplo do médico Dráuzio Varela, que seria impedido de escrever em jornais e revistas caso a volta da obrigatoriedade do diploma de jornalista seja referendada (já foi aprovada no Senado). Isso é a uma mentira, e Setti sabe disso. Como sabem todos os que, deliberadamente, confundem opinião com texto jornalístico. O doutor Varela sempre pôde escrever onde bem quisesse, e vai continuar assim.

Não é preciso ser jornalista para escrever coluna de opinião. Basta ter opinião e ser contratado para tal. 

Nos grotões do Brasil, o fim da obrigatoriedade do diploma abriu as porteiras dos jornais regionais para os jagunços dos coronéis da política. Em Diamantino (MT), o ministro Gilmar Mendes, algoz do diploma dos jornalistas no STF, colocou um técnico agrícola para dirigir a emissora da família dele (uma concessão dada à faculdade da qual ele é sócio). Márcio Mendes, o técnico em questão, chegou a usar a programação para pedir o extermínio de meninos de rua em Diamantino. 

Fazer uma reportagem exige muito mais do que “escrever bem”. Exige técnica e conhecimento, exige formação de alto nível, ainda mais nos tempos em que vivemos, onde é necessário, também, estudar e aplicar diversas formas de linguagens em plataformas tecnológicas distintas. 

“Escrever bem” é um conceito difuso e erroneamente atrelado a parâmetros distantes do texto jornalístico, que é resultado de um conjunto de técnicas específicas. Quem escreve bem artigos de opinião nem sempre tem capacidade para produzir uma reportagem, e vice-versa. 

Não basta “escrever bem” para ser jornalista. Tem que ter formação de jornalista. E foi-se o tempo em que isso era possível de acontecer dentro de uma redação, ao lado daquele bom e velho companheiro de imprensa. Esse é o argumento dos que defendem o fim do diploma de boa fé: a crença romântica na intuição pura e simples do jornalista. 

Eu, pessoalmente, não acredito nisso. Nunca acreditei, nem quando era foca lá na Tribuna da Bahia.

O argumento de má fé, contudo, é o que impera nessa discussão: a de que o diploma é um atentado à liberdade de expressão. Não é, nunca foi.

Aliás, a liberdade de expressão, como se pode notar, tirou do patriotismo a primazia de ser, no fim das contas, o último refúgio dos canalhas.

* Jornalista