Chargistas se solidarizam a Aroeira em combate à censura

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Iniciativa “Somos Todos Aroeira” reproduz charge crítica a Bolsonaro, alvo de pedido de investigação pelo governo

Chargistas, cartunistas, ilustradores e desenhistas de todo o Brasil se uniram nesta semana em solidariedade a Renato Aroeira, diante da ameaça de censura que sofreu. A iniciativa “Somos Todos Aroeira” conta com a reprodução da charge, considerada ofensiva pelo governo, que por meio do ministro da Justiça pediu abertura de inquérito com base na Lei de Segurança Nacional, instituída durante a Ditadura Militar. Além de Aroeira, é alvo do pedido o colunista Ricardo Noblat, que reproduziu a charge.

A charge de Aroeira critica o incentivo do presidente Bolsonaro à invasão de hospitais, e associa a prática ao nazismo. A ameaça do governo de criminalizar a liberdade de expressão ganhou uma resposta coletiva, com a participação de artistas de todo o País. Por meio da hashtag #somostodosaroeira, as colaborações têm sido produzidas e depois reunidas no instagram. A iniciativa é do grupo de trabalho da Revista Pirralha, do qual Aroeira faz parte.

Em nota conjunta com o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, a FENAJ repudia a iniciativa do ministro da Justiça, André Mendonça, e espera que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal não abram inquérito, já que não existe qualquer crime na charge.

Em bate-papo divulgado nesta quinta-feira com o jornalista e presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Altamiro Borges, Aroeira disse que ficou muito feliz com a solidariedade dos chargistas.

    

A ofensiva sobre a liberdade de expressão inclui a interpelação na Justiça dos desenhistas Alberto Bennet, Claudio Mor, João Montanaro e Laerte, a pedido da Associação de Oficiais Militares do Estado de São Paulo em Defesa da Polícia Militar, por charges críticas à violência policial, publicadas em dezembro de 2019 no jornal Folha de S. Paulo.

Em carta aberta assinada pela Associação dos Cartunistas do Brasil, Associação dos Quadrinhistas e Caricaturistas do Estado de São Paulo, Instituto Memorial das Artes Gráficas do Brasil e pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, as entidades manifestam solidariedade aos colegas, e denunciam a tentativa de censura.

Leia a carta na íntegra:

Carta aberta em defesa da liberdade artística e ao direito ao humor

Os chargistas, caricaturistas, desenhistas e ilustradores de todo o Brasil que subscrevem esta carta aberta manifestam sua solidariedade aos colegas vítimas da intolerância e da perseguição política assim como protestam contra a violência daqueles que procuram censurá-los.

O desprezo pela democracia dos nossos governantes chega ao ponto do próprio presidente da República, Jair Bolsonaro, por meio do seu ministro da Justiça, André Mendonça, solicitar à Polícia Federal e ao Ministério Público abertura de investigação sobre uma charge de autoria de Aroeira. A imagem, uma clara alusão a ausência de políticas sanitárias em plena pandemia causada pelo vírus da Covid-19, mostra uma cruz vermelha (símbolo da saúde) transformada em uma suástica pelas mãos autoritárias do presidente. O absurdo da iniciativa fica evidente quando sabemos que “O pedido de investigação leva em conta a lei que trata dos crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, em especial seu art. 26”. O Brasil está se tornando um país onde o humor passa a ser censurado como nos piores períodos da ditadura. O que é mais estarrecedor; uma charge ou pessoas atirando fogos sobre o STF? Esta uma ação que, sim, mereceria a atenção do Ministro da Justiça.

Como se não bastasse isso, os desenhistas Laerte, João Montanaro, Alberto Benett e Cláudio Mor estão sendo interpelados na Justiça pela publicação de cinco charges críticas à violência policial. Apresentada em dezembro de 2019 no jornal Folha de S. Paulo os trabalhos despertaram a ira da Associação de Oficiais Militares do Estado de São Paulo em Defesa da Polícia Militar, Defenda PM, que entrou na Justiça com pedido de esclarecimento criminal pois as considerou “constrangedoras”.

A função de toda boa charge é a de através do humor refletir e comentar por meio do desenho os acontecimentos de interesse do cidadão. A charge não é uma criação do nada, mas sim o termômetro do que o povo fala pelas ruas.

Portanto, é descabida a afirmação de que uma charge possa ser “constrangedora” quando o que deve constranger e chocar a opinião pública é o fato que a gerou. Sabemos que ao longo da história, diversas charges, cartuns e caricaturas resultaram em perseguição e represália aos artistas que a criaram, o que atesta a dimensão que o humor pode alcançar na sociedade.

Assim sendo, protestamos contra qualquer tentativa de cercear a liberdade artística, de imprensa, de consciência e o trabalho dos chargistas brasileiros que por meio do traço ajudam na construção de um país mais justo e solidário.

16 de Junho de 2020

Associação dos Cartunistas do Brasil
Associação dos Quadrinhistas e Caricaturistas do Estado de São Paulo
Instituto Memorial das Artes Gráficas do Brasil
Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo